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Antes dos trinta

- Ai que maravilha! Alô!
- Laura?
-Oi Carla. Posso te ligar depois? 
-Não! Que idéia. Você vai né?
-Onde? – Perguntei suspirando. 
-No encontro hoje a tarde. – Putz! 
-Carla...
-Não! Nem tenta! Passo no seu trabalho às 11:00 e faz o favor de desmarcar o que tiver para o resto do dia ta. Beijo.
Droga! Um monte de coisas para fazer e com toda a certeza a Carla não iria me deixar faltar ao encontro da turma do primário.
A manhã transcorreu normal e como eu esperava, às 11:00 em ponto, Carla estava invadindo minha sala.
-Está pronta né? – Havia uma ênfase no “né” que significava que ela não aceitaria não como resposta.
-Vamos.
 A reunião seria no prédio da escola e apesar de eu não ter ido até lá desde os meus 10 anos, eu ainda lembrava o caminho.
- Não entendo porque você esta com essa cara. Qual o problema em rever o pessoal?
- Eu não vejo problema em ir à reunião, apenas tenho um monte de coisas importantes para fazer.
-E isso não é importante? – Lancei a ela um olhar que deixava bem claro qual era a minha opinião. - Ok. Pode não ser exatamente importante, mas vai ser legal.
Não tentei argumentar. Conhecia Carla desde o primário e sabia perfeitamente que não adiantava argumentar, além do mais, eu já estava lá mesmo.
De imediato não reconheci ninguém, também seria querer muito afinal já haviam se passado quase vinte anos desde a ultima vez que eu tinha visto a maioria. Havia uma mesa com varias coisas para comer e beber e algumas cadeiras dispostas na parede oposta da mesa. Belisquei algumas coisas e procurei conversar um pouco.  A primeira pessoa que puxou conversa fio Lucia. Na época em que estudamos Lucia era baixinha e um pouco gordinha, tinha cabelos cacheados que teimavam e lutar contra gravidade. Agora, no entanto ela estava bem diferente, continuava baixinha e com cabelos cacheados, mas o peso me pareceu ideal e os cachos haviam descoberto a existência da gravidade. Ela comentou sobre o casamento e os filhos durante toda a conversa. Logo George se juntou a nós contando também sobre sua família, assim como uma outra mulher que não prestei atenção direito no nome. Aos poucos fui saindo e deixei os três contando sobre as proezas de seus filhos.  Carla estava entretida com outros dois colegas com os quais ela manteve contato após a escola. Estava prestes a sair de fininho quando Dona Alessandra, nossa ex-professora, pediu que todos sentássemos em semicírculo. Por um momento tive um flash da época da escola. Dona Alessandra sempre pedia que fizéssemos isso quando queria que lêssemos uma historia em voz alta. Não gostei da lembrança. Todos nós pegamos cadeiras e formamos um semicírculo.
-Olá meus queridos! Vocês não sabem a alegria que me da ver todos vocês assim, crescidos. – Ela olhou um a um enquanto falava. A emoção na voz dela era nítida e confesso que diante disso fiquei feliz em ter vindo. Sempre gostei da “tia” Alessandra. – Fiquei muito feliz em ver que todos se tornaram ótimas pessoas e estão felizes. Quando pensei nesse encontro, fiquei procurando algo de especial para fazer e me lembrei de uma redação que vocês fizeram e que eu guardei. Gostaria que cada um lesse a sua. O motivo de eu escolher essa redação em  particular é pelo tema dela. Foi uma das ultimas que vocês fizeram.
Ela saiu distribuindo as redações a seus respectivos autores. O tema era Antes dos Trinta. Ela perguntou quem iria começar, mas para não perder o costume ninguém se prontificou e assim como ela fazia quando éramos crianças, ela foi chamando como preferia. Haviam os mais incríveis planos para o futuro, alguns tiraram boas risadas de todos os presente. Apesar de ter 29 anos, quando Dona Alessandra chamou meu nome eu comecei a suar. Nunca gostei de falar na frente da turma. Como eu estava prestando atenção as redações que estavam sendo lidas, eu ainda não tinha lido a minha própria.
- Antes dos Trinta. Pensei muito no que eu quero ser quando ficar adulta. Gosto de bichos e seria legal cuidar deles. Também gosto muito da tia Alessandra e pensei em também ser professora, mas da muito trabalho. – Todos riram. – Depois de pensar bastante eu decidi que quero igual a minha mãe. – Minha voz embargou após ler essa frase. – Quero me casar com alguém que me de beijos sempre que sai e sempre que chega, assim como meu pai faz. Quero ter muitos filhos. Muitos não, só três, assim como é lá em casa. Quero abraços e beijos de todos eles, assim como minha mãe pede da gente. Quero ser igual a ela porque ela está sempre rindo, e quero ser assim quando ficar adulta. – Tive que forçar a voz para poder terminar de ler.
Eu havia ilustrado a redação com um desenho meu, de meu marido e de meus filhos. Não consegui prestar muita atenção as demais redações e assim que tive oportunidade fui para a área do parquinho. Nada havia mudado. Os brinquedos estavam luzindo, mas continuavam os mesmos. Os três balanços na mesma estrutura, o escorrega e as três gangorras. Me sentei em um banquinho que tinha em baixo da arvore e olhei o desenho. Re-li a redação algumas vezes e só notei que estava chorando quando meu nariz entupiu. 
- Respira! Não tem porque você chorar. Sua vida é ótima.Só tomou um rumo diferente. Você é bem sucedida.
Quem eu estava enganando. Eu era sim bem sucedida financeiramente, mas minha vida amorosa... 
A visão de um lenço em uma mão me tirou dos meus pensamentos.
- Pega.
O dono da mão era um cara um pouco mais alto que eu e possuía belos olhos castanhos que eu não fazia idéia de a quem pertencia.
-Posso? – Ele indicou o lugar ao meu lado e eu concordei com a cabeça. – Eu já vi muita gente chorar em casamentos, mas em reuniões de ex-alunos é a primeira vez. – Eu ri.
- Às vezes é complicado olhar para trás.
- É por isso que devemos sempre olhar para frente. – Ele suspirou. – Foi a redação não foi?
- O que?
-Você ficou assim, por causa da sua redação não é?
-Foi.
- Não precisa ficar assim. – Ele esfregou as mãos nas minhas costas e apesar de ele ser um completo estranho, me senti bem.
- Minha vida seguiu um rumo tão diferente.
-A de quase todos nós. Eu disse que queria ir à lua antes dos trinta.
- Alan! – Eu disse sorrindo. – Lembro de você contando para todo mundo que iria a lua um dia. – Ele também sorriu.
- E não fui, nem nunca irei. 
-Mas eu queria algo tão simples. Eu tenho um ótimo carro, um ótimo apartamento, sobrinhos que não conheço e cunhadas que nem sei qual é o nome. Além de não ter me casado e tido filhos como queria, eu ainda me afastei da minha família.
- Bom, até onde eu sei foram seus irmãos que mudaram de cidade. E encontrar alguém para casar e ter filhos não é exatamente simples. Pelo menos não se você quer realmente ser feliz. Falo por experiência própria.
- Solteiro também?
- Pior. Divorciado. Felizes nos primeiros anos e tentando não nos matar nos últimos. A única coisa boa disso tudo foi a Clara.
- Sua filha eu suponho.
-Sim. – Ele abriu um largo sorriso.
-Tem uma foto?
-Melhor. Clara!
Uma linda menina de mais ou menos cinco anos veio correndo em nossa direção. Estava tão absorta nos meus pensamentos e depois na conversa que acabei não notando a menina brincando por ali.
-Clara amor, quero que conheça uma amiga do papai. Essa é a Laura.
-Oi! – Ela me olhava tímida porem com um sorriso.
-Oi princesa. 
-Por que você tava chorando?
- É que a tia esta um pouquinho triste.
-Vamos brincar.
-Clara! – Ele tinha intenção de repreender a menina, mas o tom de voz era de quem achou divertido.
- Tudo bem Alan. 
-Vem. Brincar sempre me deixa alegre e o papai também.
- Nisso ela tem razão.
Acabei aceitando o convite. Fomos para uma praça que havia ali perto e passamos a tarde brincando. Nem lembrava qual tinha sido a ultima vez que eu havia sentado em um balanço ou em uma gangorra. Encerramos o dia com um delicioso sorvete e eu me despedi deles. Cheguei em casa exausta, mas o sorriso que eu vi no meu rosto e a alegria que estava sentindo compensavam. Tomei um bom banho e estava decidindo o que jantar quando meu celular tocou.  Não reconheci o numero.
-Alô?
- Tia Laura. – Sorri imediatamente.
-Oi minha linda.
- Eu queria saber se você quer vir na minha festinha.
-Lógico que vou. Quando é?
-Ixi! Pêra ae. Toma pai.... Oi Laura. 
- Oi Alan. Quando é a festa?
- Não é bem festa. É só um bolo, vai ser no sábado. A mãe dela sempre que organiza essas coisas, mas ela esta viajando e eu não queria que passasse em branco.
- Quer ajuda? Minha mãe sempre ajeitava tudo nas nossas festas, eu devo me lembrar de alguma coisa.
- Ia ser ótimo. – O tom da voz dele havia mudado, não identifiquei o que queria dizer, mas gostei.
-Então ta. Te vejo sexta? Sabe, para decidirmos o que fazer.
- Claro. Te mando o endereço por mensagem.
-Ok.
-Laura?
-Sim?
-Dorme bem.
-Você também.
Fiquei olhando o celular durante um tempo após desligar. Eu não sabia o que estava começando a acontecer, mas com certeza algo estava acontecendo e talvez só talvez minha vida tomasse o rumo que eu queria antes dos trinta.
Bruna Rodrigues dos Santos
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@ Moda e Eu.

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Prepare-se :) a contagem vai começar! "A arte de ignorar um desvio de comportamento, um costume, uma forma de sobrevivência, um mecanismo de defesa, de resistência, ou conseqüência do egoísmo e do medo. " Sthéfanie Paula Cachoeira rezena

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